O acordo histórico entre Mercosul e União Europeia, anunciado nesta sexta-feira durante a cúpula de líderes no Uruguai, prevê pontos chave que travaram as negociações ao longo dos últimos meses. Entre eles, estão as regras envolvendo as compras governamentais e questões ambientais, áreas com vitórias da diplomacia brasileira. Entenda a seguir os principais pontos do acordo.
Compras governamentais
A diplomacia brasileira conseguiu manter no acordo entre Mercosul e
União Europeia o uso das compras do Estado como ferramenta para
impulsionar a indústria brasileira. Em termos gerais, o objetivo é
dificultar compras externas para que o governo compre de empresas
nacionais. Entre as medidas anunciadas nesta sexta-feira está a exclusão
das compras do Sistema Único de Saúde do acordo.
Com isso, o governo brasileiro está vetado de comprar itens destinados ao SUS de outros países. A exclusão foi posta como "complexa". O governo reconhece as compras governamentais com um "instrumento para o desenvolvimento econômico e industrial" e por isso pediu a revisão deste trecho do acordo para garantir a manutenção desse instrumento como impulsionador econômico e industrial. Esta foi uma das cláusulas que travou o avanço das negociações ao longo do ano, mas terminou com uma vitória da diplomacia brasileira.
Ainda sobre compras governamentais, o texto prevê a preservação da possibilidade de encomendas tecnológicas, considerada uma política de fomento à inovação; a eliminação de restrições temporais ao uso de offsets tecnológicos e comerciais; a manutenção de espaço para políticas de incentivo a micro e pequenas empresas e agricultura familiar; e a preservação de margens de preferências para produtos e serviços nacionais.
Do lado da União Europeia, o bloco destaca que o termo do acordo "tornará mais fácil para empresas europeias concorrerem a contratos governamentais em países do Mercosul em igualdade de condições com empresas locais", fazendo com que os processos de licitação sejam mais simples e menos "discriminatórios" com as empresas estrangeiras.
Meio Ambiente
Outro ponto de impasse foi a cláusula sobre as exigências ambientais
impostas pela União Europeia. O acordo final prevê um reforço do
compromisso ambiental e econômico, mas rechaça "barreiras desnecessárias
ao comércio". Os dois blocos acordaram uma série de compromissos de
proteção ao meio ambiente e de promoção do trabalho decente. O Brasil
tinha preocupação com a questão ambiental por temer que a nova lei
antidesmatamento da Europa fosse usada para dificultar a entrada de
produtos brasileiros na União Europeia. Esse trecho do acordo seria um
mecanismo de proteção em caso de medidas unilaterais vistas como
protecionistas.
A União Europeia destaca que os dois blocos concordara em apoiar os padrões climáticos e ambientais existentes, proibindo o incentivo indevido do comércio e investimentos violando leis ambientais. O acordo também tem compromissos sobre pesca sustentável e manejo florestal sustentável, além da implementação o acordo de Paris.
Automóveis
O acordo removerá impostos de importação sobre mais de 91% dos produtos
da União Europeia exportados para o Mercosul. No caso das peças de
automóveis, a taxa do Mercosul sobre os itens é de 14% a 18%.
O governo brasileiro, por sua vez, destacou que as condições flexíveis sobre as questões tarifárias valem para veículos eletrificados e para veículos de novas tecnologias, mesmo as ainda não disponíveis comercialmente.
Para veículos eletrificados, a desgravação passará a se dar em 18 anos. Para veículos a hidrogênio o período será de 25 anos, com 6 anos de carência. Para novas tecnologias, 30 anos, com 6 anos de carência.
Houve, ainda , a criação de uma salvaguarda de investimentos para o setor automotivo para preservar e ampliar investimentos automotivos.
Isso significa que caso haja um aumento de importações europeias que causem dano à indústria, o Brasil pode suspender o cronograma de desgravação de todo o setor ou retomar a alíquota aplicável às demais origens (hoje, de 35%) por um período de 3 anos, renovável por mais 2 anos, sem necessidade de oferecer compensação à União Europeia.
Agronegócio
Neste tópico, a União Europeia afirma que as comunidades agrícolas do
seu bloco terão acesso mais fácil ao mercado do Mercosul, assim como a
oportunidade de venda dos seus produtos para os consumidores do outro
grupo.
O Mercosul tem grande potencial de consumo de produtos como vinho, queijos e chocolates. O acordo removerá as tarifas e outras barreiras comerciais.
Este foi um dos pontos mais críticos do acordo em razão dos entraves impostos pelo governo da França. O presidente Emmanuel Macron sofreu forte pressão de agricultores em razão de um possível concorrência com os produtos agrícolas do Brasil e da Argentina, principalmente.