Abalado após a derrota nas urnas, o presidente
Jair Bolsonaro
submergiu do cenário político nacional nas duas últimas semanas, mas
prepara uma volta como líder da oposição ao governo do presidente eleito
Luiz Inácio Lula da Silva,
com expectativa de se manter presente e ativo em Brasília, segundo três
fontes ligadas a ele com quem a Reuters conversou nos últimos dias.
Bolsonaro
praticamente não fez aparições públicas e reduziu drasticamente sua
presença nas redes sociais desde o revés eleitoral em 30 de outubro. Até
esta sexta-feira, conforme sua agenda oficial, foram seis dias sem
compromissos e os outros cinco com agendas fechadas com ministros e
auxiliares.
O único momento em que apareceu em público foi na rápida
declaração feita no Palácio da Alvorada depois de mais de 44 horas de
silêncio desde a derrota nas eleições, em que disse que continuará
seguindo os mandamentos da Constituição, mas não reconheceu a vitória de
Lula.
Seu outro único pronunciamento foi um vídeo
gravado aos caminhoneiros e demais manifestantes bolsonaristas que
bloqueavam rodovias do país em protestos que pediam uma intervenção
militar para impedir Lula de tomar posse. O presidente pediu que as vias
fossem liberadas, mas disse que os protestos eram "do jogo democrático"
-- apesar do cunho golpista dos atos.
Mulher que teve carro depredado por bolsonaristas na PB posta vídeo de agressão sofrida no local:
O presidente nem sequer comentou o relatório do
Ministério da Defesa entregue ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na
quarta-feira sobre o processo eleitoral, que era apontado por ele como
fundamental para considerar a eleição "limpa". O documento atestou não
ter havido fraude nas eleições, mas apontou vulnerabilidades hipotéticas
no sistema.
No dia seguinte, na quinta, a própria
pasta divulgou nota em que disse --sem apresentar evidências-- não ser
possível excluir a possibilidade de fraude ou inconsistência nas urnas
eletrônicas e no processo eleitoral. Havia quem dizia, segundo uma das
fontes, que essa poderia ser uma última cartada para Bolsonaro
questionar as eleições.
A equipe de comunicação do
presidente chegou a pedir para jornalistas se preparem para uma fala de
Bolsonaro no Palácio do Alvorada, mas o pronunciamento --que não chegou a
ser oficialmente convocado-- não aconteceu. Pela segunda semana
seguida, o presidente também não fez sua live semanal das quintas-feiras
nas redes sociais.
Aliados que estiveram com
Bolsonaro nos últimos dias, segundo as três fontes, têm relatado que ele
está abatido, ainda digerindo a derrota nas urnas e o caminho do seu
futuro político.
PRF é recebida a tiros em bloqueio ilegal no Pará:
Um ministro que se encontrou com o presidente disse,
reservadamente, que ele está com uma infecção na perna e não pode usar
calças, por isso o motivo da reclusão. Outra fonte afirmou que ele teria
contraído erisipela.
Procurada, a Secretaria de
Comunicação da Presidência não respondeu de imediato a pedido de
informação sobre o estado de saúde de Bolsonaro e o motivo de não estar
tendo agendas públicas.
No mundo virtual, ambiente em
que tem forte influência e que o ajudou a catapultar ao Palácio do
Planalto nas eleições de 2018, o presidente também segue praticamente em
silêncio.
Além de não ter feito as lives desde o
segundo turno das eleições, Bolsonaro fez apenas três postagens no
Facebook, rede social em que tem 15 milhões de seguidores: uma em que
postou o pronunciamento do dia 1º de novembro, a outra em que pediu para
seus simpatizantes desobstruírem as rodovias e uma terceira em que há
uma foto em que agita uma bandeira na frente do Palácio do Planalto.
No Twitter e no YouTube a presença do presidente também diminuiu significativamente.
Bolsonaristas atacam agentes da PRF em bloqueio ilegal em SC:
MOMENTO DO RETORNO
Entre aliados, segundo as
fontes, é tido como certo que Bolsonaro vai retornar à disputa política,
buscando antagonizar com a gestão do Lula. A dúvida é sobre quando ele
vai reaparecer para valer, se nas próximas semanas ou somente a partir
de janeiro, com o petista empossado no Palácio do Planalto.
O
cenário para dar um papel de destaque está sendo montado pelo
presidente do PL, Valdemar Costa Neto, que anunciou publicamente ter
oferecido o cargo de presidente de honra da legenda para Bolsonaro, além
de já tê-lo lançado como candidato do partido à Presidência daqui a
quatro anos.
A intenção, segundo duas fontes, é que o
futuro ex-presidente conte com uma estrutura de trabalho pelo partido e
faça viagens para discutir e manter acesso às propostas dele. Uma das
ideias em discussão, conforme uma dessas fontes, é que ele finque base
política em Brasília, dando entrevistas, recebendo apoiadores e
contestando atos do governo Lula. A retomada do uso das redes sociais
também está no radar.
Bolsonaristas invadem ônibus e agridem estudantes que fizeram 'L':
Há até quem defenda que ele vá rotineiramente ao
Congresso Nacional para marcar posição e defender propostas que
representem seu partido e manter o contato com os 58 milhões de
eleitores que votaram nele no segundo turno, disse essa fonte.
"Valdemar
quer aproveitar esse embalo para estruturar o PL em um partido forte e
com chances de ganhar em 2026", disse essa fonte.
Aliados
comparam a situação de Bolsonaro à do ex-presidente dos Estados Unidos
Donald Trump, que logo após a derrota para o democrata Joe Biden começou
um trabalho para pavimentar a sua candidatura à Casa Branca em 2024,
disse outra fonte.
Uma das preocupações, conforme
essa fonte, é equilibrar a manutenção do apoio dos simpatizantes do
futuro ex-presidente, mantendo a militância bolsonarista mais aguerrida
mobilizada, mas sem respaldar e avalizar manifestações e protestos
violentos e antidemocráticos. Por isso ele buscou manter uma distância
tácita dos bloqueios de caminhoneiros e de apoiadores dele em frente a
quarteis pedindo intervenção militar.
Bolsonaro pede a apoiadores o fim dos bloqueios em rodovias e diz estar triste:
À semelhança de Trump, o receio que perpassa a conversa
de pessoas próximas, segundo as fontes, é o risco de que Bolsonaro e
filhos dele possam ser presos após o presidente deixar o cargo e perder o
foro privilegiado.
A avaliação corrente é que ele
pode ficar sujeito a uma decisão de um juiz de primeira instância no
caso das apurações que descerem do Supremo Tribunal Federal (STF) ou
mesmo de uma medida mais enérgica do STF, notadamente do ministro
Alexandre de Moraes, disse uma das fontes. Bolsonaro responde a quatro
investigações criminais na corte e alvo de ações no Tribunal Superior
Eleitoral.
Contudo, uma detenção de Bolsonaro, ainda
que provisória, seria capaz de incendiar o país, avaliou uma segunda
fonte, desencadeando uma onda de protestos.